
Demorou, mas veio a reação.
Um escritório de advocacia de São Paulo percebeu.
A morte de Fábio Hamilton Cruz pode custar caro.
Muito caro para a Odebrecht, Fast Engenharia e WDS Construções.
Ao contrário dos familiares dos outro sete operários mortos.
A de Fábio se prepara para enfrentar os poderosos.
Até agora, tudo o que receberam foi um grande 'sinto muito'.
Além de flores, transporte do corpo e caixão para o enterro em Diadema.
O principal ponto que os advogados vão se pegar será no treinamento.
A família insiste que Fábio não tinha capacidade para estar a nove metros do solo.
Ele vendia doces nos faróis de São Paulo antes de trabalhar no Itaquerão.
Foi contratado como ajudante geral.
Não tinha qualificação alguma.
Ainda mais sem a supervisão de chefes, como garantem testemunhas.
Nos Estados Unidos e na Europa, mortes na construção civil é um assunto sério.
E responsável por processos milionários.
Como por exemplo o caso da Adams Thermal Systems Inc.
Um operário morreu esmagado por uma máquina na empresa em 2011.
A Adams teve de pagar US$ 1,3 milhões (cerca de R$ 2,9 milhões).
Parte do dinheiro, US$ 450 mil (cerca de R$ 1 milhão) à família.
O restante em multas ao governo.
No ano passado houve um grave acidente.
Na construção do estádio do San Francisco 49ers.
Donald White era um mecânico especializado em elevadores.
Um deles caiu e o matou esmagado.
A California Occupational Safety and Health Administration tomou uma decisão imediata.
Multou os construtores em US$ 54 mil (cerca de R$ 123 mil).
A partir daí, a família de Donald tem até mais força para buscar seu ressarcimento.
E processar o San Francisco 49ers e os empreiteiros.
No Brasil não há esse costume.
Até porque os operários da construção civil costumam vir de famílias simples.
Fábio, por exemplo, recebia R$ 1,066,00 por mês.
O processo de R$ 1 milhão chega em hora oportuna.
O Corpo de Bombeiros do Estado de São Paulo aponta 26 irregularidade no Itaquerão.
A arena não será liberada se essas falhas não forem corrigidas.
Entre elas, a área de escape do estádio em caso de incêndio.
O tempo máximo aceito é de oito minutos, o que já é perigoso demais.
No Itaquerão, uma pessoa levaria até 11 minutos para tentar sair.
Esse tempo poderia significar a diferença entre viver e morrer.
O Ministério Público promete interditar o estádio.
Até mesmo durante a Copa.
Basta não atender a todas as exigências do Corpo de Bombeiros.
Para dar um tom sombrio e inacreditável a tudo isso...
Surge Luiz Antônio Medeiros.
Ou melhor, ressurge.

Para quem não se lembra ele foi candidato ao governo de São Paulo.
Foi presidente do Sindicato dos Metalúrgicos paulista.
Fundador da Força Sindical.
Hoje ele é superintendente do Ministério do Trabalho em São Paulo.
Ele teve a coragem de declarar à Folha.
"Se esse estádio (o Itaquerão) não fosse da Copa, os auditores teriam feito um auto de infração por trabalho precário e paralisado a obra. Estamos fazendo de conta que não vemos algumas coisas irregulares. Não vamos nem entrar neste assunto porque vai atrasar ainda mais a obra. Falei com o ministro (do Trabalho) e ele deu respaldo."
Vale a pena repetir duas partes mais importantes.
"Estamos fazendo de conta que não vemos."
"Falei com o ministro e ele deu respaldo".
As declarações do superintendente do Ministério do Trabalho são suicidas.
Qualquer advogado de um dos três mortos no Itaquerão saberá o que fazer com elas.
Mas tem mais.
De acordo com Medeiros, fiscais do Ministério do Trabalho perceberam.
Operários trabalhando no estádio sem equipamentos de segurança individuais.
Ele disse ainda que a fase pior está chegando.
"O momento do desmonte é quando acontecem muitos acidentes.
Isso passou a ser a nossa preocupação."
Ou seja, se houver novas mortes não será surpresa.
Em que lugar civilizado o Ministério do Trabalho brinca com milhares de vida.
"Fazer de conta que não vê problemas para não atrasar ainda mais o estádio."
E com o respaldo do ministro Manuel Dias.
Constrangido com a revelação, Dias mandou sua assessoria se manifestar.
E ditou uma declaração para os veículos de comunicação.
"O único respaldo que o ministério deu ao superintendente Medeiros foi fazer a fiscalização nas obras dentro do que determina a lei e, se possível, dentro de um entendimento com a empresa responsável pelas obras (a Odebrecht)."
As famílias dos oito operários mortos nas arenas brasileiras lamentam.
Perderam seus entes queridos.
Uma vida não tem preço.
Mas quando ela é perdida por acidentes evitáveis, não.
O mínimo que os familiares merecem é o conforto material.
E ele deverá a começar a vir em processos milionários.
Para surpresa de construtoras, empreiteiras, os humildes se rebelaram.
Grandes escritórios de advocacia podem fazer justiça.
Cobrar o descaso com a vida neste país.
A família de Fábio Hamilton Cruz já comprou a briga.
E deverá ser seguida.
Só no Itaquerão três trabalhadores morreram.
Na Arena Amazônia foram mais quatro.
E outra no estádio Mané Garrincha em Brasília.
Isso só em estádios que participarão da Copa.
Morreram mais dois operários.
Um na nova arena do Palmeiras.
E outro na do Grêmio.
Dez vidas perdidas.
Dez famílias despedaçadas.
E que ganharam até agora migalhas por suas tragédias.
Mas o quadro está para mudar.
É mais do que obrigatório.
Nesse país que o ministério do Trabalho assume.
'Faz de conta' que não vê problemas em estádios que podem matar brasileiros.
O ponto final está nas mãos dos advogados.
Processos milionários são milagrosos.
Principalmente para quem expõe a vida humana...

Fonte: R7
Nenhum comentário:
Postar um comentário